Introdução |
A dor neuropática é aquela que ocorre como uma consequência direta de lesão ou de doença que afeta o sistema somatossensitivo.1 A neuropatia periférica dolorosa crônica atinge, respectivamente, 16,2% e 4,9% dos indivíduos com e sem diabetes.2
A duloxetina é fármaco antidepressivo que inibe, de forma relativamente balanceada, as recaptações de serotonina e de noradrenalina.3 Essa ação faz o medicamento um bom modulador da dor,4-6 pois aumenta a transmissão nas vias descendentes fisiológicas antinociceptivas e com isso diminui a transmissão nociceptiva aferente nas vias dolorosas ascendentes de dor.5 Sua ação analgésica independe de seus efeitos antidepressivos.5,7
O objetivo da revisão sistemática desenvolvida por Lunn e colaboradores (2014) foi avaliar os benefícios e riscos da duloxetina nos tratamentos da neuropatia dolorosa e dos diferentes tipos de dor crônica.5
Métodos |
Incluíram estudos clínicos randomizados e duplos-cegos com a duloxetina nos tratamentos da neuropatia dolorosa, da dor neuropática crônica, da dor crônica sem causa identificada ou da fibromialgia.5 Foram excluídos pacientes em que a dor crônica não fosse neuropática.5
O desfecho primário foi a melhora da dor a curto prazo (até 12 semanas) em avaliação por escalas de intensidade de dor. A melhora foi considerada quando seu alívio surgiu em porcentagem ≥ 50, considerando a escala numérica.5 Os desfechos secundários incluíram alívio da dor a longo prazo (> 12 semanas), melhora da dor ≥ 30%, aprimoramento ≥ 30% da qualidade de vida, avaliação por impressão global de mudança clínica relatada pelo paciente (PGIC).5 Também foi analisada a incidência de eventos adversos (EA).5
Resultados |
Incluíram-se 18 estudos nesta revisão, com um total de 6.407 pacientes. Dentre esses, oito estudos (n = 2.728) avaliaram a duloxetina no tratamento da neuropatia diabética periférica dolorosa; seis (n = 2.249) em pacientes com fibromialgia; três (n = 1.382) em pacientes com dor no contexto de transtorno depressivo maior (TDM) sem diagnóstico alternativo conhecido; e um (n = 48) em pacientes com dor neuropática central.5
> Neuropatia diabética periférica
Em cinco estudos que utilizaram o desfecho primário da revisão de Lunn e colaboradores (2014), o risco relativo (RR) de melhora ≥ 50% da dor foi de 1,53 (intervalo de confiança [IC]: 1,19-1,96) com duloxetina em qualquer dose (de 20 a 120 mg/dia), em comparação ao placebo.5,8-12 A duloxetina foi significativamente melhor que o placebo nas doses 40 mg, 60 mg e 120 mg/dia, mas não com 20 mg/dia (RR: 1,43; IC 95%: 0,98-2,09).5 Não foi observado efeito dose-dependente.5
Houve semelhança entre os resultados para melhora da dor nos parâmetros maiores ou iguais a 30% e a 50% (RR de melhora: 1,45; IC 95%: 1,30-1,63), verificando-se alívio significativo com duloxetina nas doses de 40, 60 e 120 mg/dia.5,9-13
Em relação à qualidade de vida, avaliada pelo questionário SF-36, houve melhora significativa, em comparação ao placebo, com as doses de 60 e 120 mg/dia.5 O mesmo ocorreu com os valores da escala PGIC (Patient Global Improvement Change Scale) e do Inventário Breve de Dor (BPI, sua sigla em inglês), com a dose 20 mg/dia, em comparação ao placebo.5
> Neuropatia periférica dolorosa
Um único estudo comparou a duloxetina (titulada até 60 mg/dia) com a amitriptilina (titulada até 50 mg/dia), porém apenas 65% e 48% dos pacientes atingiram a dose-alvo da duloxetina e da amitriptilina, respectivamente. O alívio da dor ≥ 50% foi atingido por 59% e 55% dos pacientes dos grupos “duloxetina” e “amitriptilina”, respectivamente.15
> Fibromialgia
Seis estudos controlados avaliaram a duloxetina no tratamento da dor na fibromialgia.16-21 A melhora da dor ≥ 50% após 12 semanas foi significativamente mais frequente com a duloxetina 60 mg/dia (RR: 1,57; IC 95%: 1,20-2,06; n = 528) e 120 mg/dia (RR: 1,69; IC 95%: 1,40-2,03; n = 1.234) do que com o placebo.5 No entanto, a duloxetina 20 mg/dia demonstrou efeito semelhante ao do placebo.5
A melhora da dor ≥ 50% após 28 semanas foi significativamente mais comum com a duloxetina do que com o placebo (RR: 1,40; IC 95%: 1,09-1,79), sem diferenças entre as doses de 60 e 120 mg/dia.5
A duloxetina também se associou a um maior número de pacientes com melhora da dor ≥ 30% (RR: 1,38; IC 95%: 1,22- 1,56; n = 1.673), porém esse efeito foi observado apenas com 60 mg/dia (RR: 1,52; IC 95%: 1,24-1,85; n = 528) e 120 mg/dia (RR: 1,46; IC 95%: 1,26-1,69; n = 1.020). Não houve diferenças significativas entre a duloxetina 20 mg ou 30 mg/dia e o placebo.5
Em relação à qualidade de vida e levando-se em conta a comparação com o placebo, houve melhora significativa do componente mental com duloxetina 30, 60 e 120 mg/dia, do componente dor corporal com 60 e 120 mg/dia e do componente físico com 120 mg/dia.5
> Sintomas físicos dolorosos no contexto do transtorno depressivo maior (TDM), não explicados por diagnósticos alternativos
Três estudos (n = 1.023) avaliaram a dor em pacientes com TDM e demonstraram que, comparada ao placebo, a duloxetina 60 mg/dia foi associada à proporção significativamente maior de pacientes que atingem melhora da dor ≥ 50% (RR: 1,37; IC 95%: 1,19-1,59).24-26 Resultado semelhante foi observado em relação ao alívio da dor ≥ 30% (RR: 1,27; IC 95%: 1,15-1,40).22-24
> Dor neuropática central
Houve apenas um estudo pequeno que incluiu 48 pacientes e que não conseguiu mostrar efeito da duloxetina no alívio da dor, embora tenha sido observada melhora na Impressão Clínica Global de Melhora (PGI-I) com a duloxetina, em comparação ao placebo (RR: 2,75; IC 95%: 1,02-7,44).25
> Efeitos adversos
Os EA foram avaliados conjuntamente. Aqueles graves foram infrequentes e com incidências semelhantes com duloxetina (qualquer dose) e placebo. Foram 42 eventos em 2.785 pacientes tratados com duloxetina e 39 eventos em 2.191indivíduos do grupo “placebo”; RR: 0,85; IC 95%: 0,53-1,25).5
Os EA menos graves foram frequentes, tanto com a duloxetina (2.033 eventos em 2.796 pacientes), como com o placebo (1.530 eventos em 2.462 indivíduos; RR: 1,15; IC 95%: 1,11-1,20).5 Os EA mais comuns foram náuseas, boca seca, tontura, sonolência, sudorese e rinite; ainda, eles foram mais comuns com 120 mg/dia do que com 60 mg/dia.5
Conclusão |
A duloxetina nas doses de 60 mg/dia e 120 mg/dia é eficaz nos tratamentos da dor neuropática diabética, da fibromialgia e da dor associada a sintomas depressivos.