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Carcinoma espinocelular

O câncer de pele é o mais comum das neoplasias malignas do corpo humano e, por isso, possui grande importância dentro da atividade dermatológica.

Autor/a: Dra. Mariana Nadalin Meireles

Indice
1. Texto Principal
2. Referências bibliográficas

1 | Etiopatogenia

O carcinoma espinocelular (CEC), também chamado de carcinoma de células escamosas, é o segundo mais frequente tipo de câncer de pele não melanoma, atrás apenas do carcinoma basocelular (CBC). A incidência do CEC gira em torno de 20% a 50% dos tumores cutâneos e vem crescendo nos últimos anos. Por esse aumento na incidência e pela possibilidade de alguns casos terem um pior prognóstico, o carcinoma espinocelular tem sido um problema de saúde pública nos EUA.1

Os fatores de risco que predispõem ao surgimento do CEC são: fototipo baixo, idade avançada, sexo masculino (3:1), exposição à radiação ultravioleta, imunossupressão, HPV, doenças cicatriciais, algumas síndromes que predispõem a tumores cutâneos e exposição aos arsênicos. Entre todos esses fatores de risco (resumidos na tabela 1), os mais significativos são exposição à radiação UV, idade, pele clara e imunossupressão.

Além do principal fator ambiental relacionado ao CEC, que é a radiação ultravioleta, sabemos que os arsênicos, os hidrocarbonetos aromáticos, as nitrosaminas, os agentes alquilantes e a radiação ionizante também estão associados. No caso da radiação ionizante, o CEC é ainda mais agressivo com risco de até 30% de metástase.

As mutações genéticas comumente associadas ao CEC estão relacionadas com os seguintes genes: TP53, CDKN2A, RAS e NOTCH.4

Tabela 1 - resumo dos fatores de risco associados ao CEC.2

2 | Classificação

- Carcinoma Espinocelular in situ

O Carcinoma Espinocelular in situ é um carcinoma de células escamosas restrito à epiderme, ou seja, não há invasão da camada basal (Fig. 1).

Figura 1 - CEC in situ/doença de Bowen: proliferação intraepitelial desorganizada de ceratinócitos atípicos ocupando toda a epiderme. Foto cedida por Dra. Daniela Takano.

Sua apresentação clínica é comumente uma placa eritematosa, hiperqueratósica e de bordas bem definidas (Fig. 4a).

- Carcinoma espinocelular invasivo

Em geral, CEC invasivo geralmente aparece na pele fotoexposta. Clinicamente, costuma se apresentar como uma lesão pápulo-nodular (Fig. 6a), mas pode se apresentar como uma placa, uma lesão papilomatosa ou exofítica. O tumor pode ter um componente queratósico, vegetante ou até ulcerado.5 Quando a lesão é acompanhada de sintomas neurológicos, isso é um indício de comprometimento neural, o que piora o prognóstico.

Os subtipos histológicos que são bem diferenciados e apresentam potencial metastático baixo são o queratoacantoma e o carcinoma verrucoso, que inclui Buschke- -Lowenstein na genitália e o epitelioma cuniculatum na planta dos pés.

Figura 2 - CEC invasivo bem diferenciado. Invasão da derme por ceratinócitos atípicos, diferenciação escamosa evidente, formação de pérolas córneas. Foto cedida por Dr. Nilceo Michalany

Os subtipos com prognóstico pior são: CEC desmoplásico, CEC adenoescamoso e CEC associado à cicatriz. No caso do CEC desmoplásico, a recidiva e a metástase são, respectivamente, 10x e 6x maiores que nas outras variantes. Além do subtipo histológico, outras variáveis merecem especial atenção porque estão associadas a mais recidiva e metástase e estão sintetizadas a seguir:2

  • Diâmetro: tumores maiores que 2 cm são os mais associados com metástase e mortalidade específica pela doença.6
  • Profundidade: tumores com Breslow maior que 2 mm estão mais associados com recidiva e metástase. Isso significa que tumores que invadem abaixo do tecido subcutâneo têm 28% de chance de recidivar e 27% de chance de comprometimento linfonodal.7
  • Invasão perineural: invasão perineural de nervos de largo calibre (≥ 0,1 mm) está associada a mais chance de metástase linfonodal e mortalidade pela doença. O risco é de 47% de recorrência e 35% de metástase na cirurgia convencional com margens amplas. Porém, se o tratamento for feito com cirurgia de Mohs e radioterapia complementar, esse risco baixa para próximo de zero para recorrência e 6% para metástase.8
  • Diferenciação histológica: tumores mal diferenciados (Fig. 3) apresentam o triplo de risco de recidivar e o dobro de risco de metastatizar.9
  • Tumores recidivados: uma vez que o tumor recidiva, o prognóstico piora muito, aumentando muito o risco de comprometimento linfonodal e metástase a distância.10
  • Localização: tumores localizados na área da cabeça e pescoço têm mais chances de recidiva apenas pela localização. Os CECs na região dos lábios, orelhas e genitália tendem a ter um comportamento ainda mais agressivo.6,11 Não podemos nos esquecer dos tumores que se originam nas cicatrizes, úlceras ou áreas previamente irradiadas que chegam a apresentar um risco de 26% de metástase.12
  • Imunossupressão: tumores em imunossuprimidos tendem a ter crescimento mais rápido e pior prognóstico.

Figura 3 - CEC pouco diferenciado: neoplasias de células atípicas exibindo, focalmente, sinais de ceratinização. Imagem cedida por Dra. Daniela Takano.

3 | Diagnóstico

O diagnóstico clínico do CEC é realizado pelo dermatologista, por meio do exame visual e da palpação da lesão que nos permite ter ideia do grau de infiltração desta. Em geral, as lesões estão localizadas em áreas fotoexpostas de pacientes com fototipo baixo, mas não podemos esquecer que o CEC também pode aparecer em áreas protegidas do sol, como a região genital, em pacientes de fototipo alto e em áreas cicatriciais.

Além do exame clínico, a dermatoscopia é uma ferramenta de grande valor, aumentando a acurácia diagnóstica.13 No caso do CEC in situ/doença de Bowen, a presença de vasos glomerulares e escamas branco-amareladas aderidas sugere o diagnóstico em 90% dos casos14 (Fig. 4 b).

No CEC invasivo, a dermatoscopia mostra predomínio de vasos em grampo, vasos irregulares tortuosos, áreas esbranquiçadas sem estruturas, rolha central de queratina e ulceração15 (Fig. 6 b). É fundamental que o exame físico contemple toda a pele do paciente com CEC. Esses pacientes apresentam risco aumentado de desenvolver melanoma e outros tumores cutâneos.16,17

Após o exame clínico e dermatoscópico da lesão suspeita, biópsia deverá ser realizada. Essa biópsia deve incluir derme reticular profunda. As biópsias superficiais não permitem estratificar o tumor e, assim, decidir o tratamento mais apropriado. A palpação dos linfonodos é um item que também nunca deve ser esquecido no CEC e será detalhado mais adiante, com a necessidade ou não de exames complementares de imagem.

Figura 4 a - CEC in situ: placa eritemato-queratósica na região do punho de um paciente com múltiplos tumores não melanoma. | Figura 4 b - Dermatoscopia mostrando placa eritemato-queratósica com áreas de crostas branco-amareladas e áreas de descamação mais fina.

 

Figura 5 - Dermatoscopia de uma doença de Bowen com a presença de vasos glomerulares agrupados. A lesão clinicamente era uma placa eritemato-descamativa.

Figura 6 a - CEC invasivo no braço: lesão pápulo eritemato-nodular com rolha córnea central. | Figura 6 b - Lesão nodular caracterizada por rolha córnea central, áreas hemorrágicas, ulceração, vasos polimórficos e áreas amorfas esbranquiçadas (pérolas córneas).

Esquema adaptado da NCCN 2021 para conduta perante lesão suspeita de CEC.

4 | Tratamento

Após o resultado da biópsia, o tumor deverá ter seu risco estratificado para decidirmos o planejamento terapêutico e o seguimento. Esse assunto foi introduzido no item “classificação” desta separata e, agora, vamos abordá-lo de uma maneira mais prática baseada em guidelines recentes. O CEC pode ser estratificado em três categorias: baixo risco, alto risco e muito alto risco. Os tumores classificados como “alto risco” são aqueles com elevada chance de recidiva local e os de “muito alto risco” têm altas chances de recidiva e metástase.

Essa subclassificação de “muito alto risco” foi incorporada em fevereiro de 2021 à mais atualizada versão do guideline da National Comprehensive Cancer Network (NCCN).18

O outra mudança muito importante para nos atentar nessa nova versão é que houve a “fusão” da área M (área de médio risco) com a área H (área de alto risco), sendo agora ambas consideradas de alto risco, independentemente do tamanho do tumor.19

É fundamental entendermos que para incluir um tumor na categoria alto risco ou muito alto risco, basta apenas a presença de um critério positivo na coluna da tabela 2. Exemplo: se o CEC estiver numa localização considerada de alto risco (ex.: face), independentemente do tamanho e mesmo que apresente as demais características da tabela de bom prognóstico, será considerado de alto risco.

Se for maior que 4 cm, independentemente de qualquer outro fator de bom prognóstico, será considerado muito alto risco e, assim, sucessivamente. A estratificação de risco está sintetizada na tabela 2:

Tabela 2 - Adaptada da NCCN 2021, a tabela separa os tumores de baixo, alto e muito alto risco. A presença de qualquer uma das características na coluna de alto ou muito alto risco automaticamente inclui o tumor nessas categorias.18

Após a estratificação do risco do tumor, podemos nos direcionar ao tratamento mais indicado para cada categoria.

5 | CEC de baixo risco

Os CECs classificados de baixo risco são os tumores na área L (Fig. 6) menores que 2 cm, bem diferenciados, sem invasão de subcutâneo e sem as outras características de pior prognóstico conforme a tabela 2. Podem ser tratados com as seguintes modalidades terapêuticas:

  • Cirurgia convencional: a cirurgia deve ter margem tridimensional de 4 a 6 mm ao redor da lesão e a reconstrução deve ser com sutura linear ou segunda intenção ou enxerto. Não é indicada a realização de retalhos sem antes se certificar das margens livres. Se após o exame anatomopatológico houver comprometimento das margens, o paciente deverá ser submetido à cirurgia micrográfica de Mohs ou às suas variantes. Se não houver a possibilidade de realizar o exame detalhado das margens e houver a possibilidade de nova cirurgia convencional, esta será aceitável. Nos pacientes que não sejam candidatos à reabordagem cirúrgica, existe a possibilidade de radioterapia.
  • Curetagem e eletrocoagulação: essa modalidade terapêutica NÃO deve ser utilizada se o tumor estiver localizado em áreas de pelo terminal (couro cabeludo, púbis, axilas e barba).
  • Se, durante o procedimento, o tecido adiposo for alcançado pelo tumor, o procedimento deverá ser revertido para excisão convencional. Apesar de ser uma terapia aceitável nos tumores de baixo risco, é importante lembrar que nessa modalidade não temos o controle histológico das margens.
  • Radioterapia: é uma opção aos candidatos não cirúrgicos ou aos casos de margens comprometidas que não possam ser reoperadas. Deve ser reservada aos pacientes acima de 60 anos.20,21 Além de ser contraindicada a pacientes com síndromes genéticas que predispõem ao câncer de pele, como SD do nevo basocelular, tem contraindicação relativa em colagenoses.
  • Terapias superficiais: são aquelas que não penetram além da epiderme e apresentam taxas de cura menores que as das técnicas cirúrgicas.22,23 Sendo assim, devem ser reservadas para os CEC in situ que não apresentem outras características de alto risco como, por exemplo, a localização.

Podem ser consideradas em lesões in situ menores que 2 cm na área de baixo risco (área L). Igualmente como acontece com a curetagem e a eletrocoagulação, o controle histológico da margem não é contemplado nessa modalidade. São exemplos de terapias superficiais: imiquimode a 5% tópico, 5-FU, terapia fotodinâmica (PDT) e crioterapia. Entre 5-FU e imiquimode a 5% tópico, estudos sugerem que esse último apresenta melhores resultados no CEC in situ. 24-26

Figura 7 - Área L: Localização de baixo risco: tronco e extremidades (excluindo a área pré-tibial, genitália, mãos, pés).

Esquema adaptado da NCCN 2021 para conduta diante de lesão suspeita de CEC.

6 | CEC de alto/muito alto risco

Os CECs de alto risco (alto risco de recidiva local) são os tumores localizados na região da cabeça, pescoço, mãos, pés, pré-tibial ou anogenital, não importando seu tamanho (Fig. 7), ou tumores maiores que 2 cm nas áreas de baixo risco (Fig. 6).

É importante ressaltar que para o CEC ser classificado como alto risco, precisa ter apenas uma destas características: localização de alto risco e/ou tamanho maior que 2 cm e menor que 4 cm, e/ou bordas mal definidas e/ou recorrente; e/ou em imunossuprimido e/ ou em local com radioterapia ou cicatriz prévia; e/ou crescimento rápido; e/ou sintomas neurológicos; e/ou subtipo histológico agressivo; e/ou invasão perineural (Tabela 2).

Caso o CEC tenha 4 cm ou mais, e/ou seja indiferenciado, e/ou invada abaixo do subcutâneo, e/ou apresente desmoplasia, e/ou invasão perineural em nervos medindo a 0,1 mm ou mais (nervos na derme profunda), e/ou invasão linfovascular, será automaticamente considerado CEC de muito alto risco (elevado risco de recidiva local e metástase). (Tabela 2).

Após classificarmos CEC como de alto/muito alto risco, as possibilidades terapêuticas são:

Cirurgia micrográfica de Mohs ou variantes do método micrográfico de controle de margens. A cirurgia micrográfica de Mohs é a técnica de escolha para os CEC de alto/muito alto risco porque permite altos índices de cura com a máxima preservação tecidual. Isso acontece porque é uma técnica que permite avaliação de 100% das margens cirúrgicas no intraoperatório.

Estudos retrospectivos mostram 96% de cura em CECs primários.27,-29 Inúmeros estudos comprovam que a técnica de cirurgia de Mohs é superior à cirurgia convencional, garantindo menos risco de recidivas locais.12,19,27-29 Caso não haja possibilidade de realizar a técnica de Mohs, apenas técnicas que incluam toda a periferia e a profundidade da peça poderão ser aceitas como alternativas.18

Cirurgia convencional com margens mais amplas com reconstrução por sutura linear ou segunda intenção ou reconstrução após resultado da parafina. A rotação de retalhos não deve ser executada sem antes da obtenção do resultado de margens livres pelo exame de parafina. Toda a área de eritema ao redor do tumor deve ser inclusa como tumor e a margem demarcada a partir desse halo. A margem vai variar de 6 mm a 1 cm, dependendo de uma série de características relacionadas ao paciente e ao tumor. Após o resultado da parafina, caso a margem esteja comprometida, é ideal que seja realizada cirurgia de Mohs ou outra cirurgia com controle micrográfico de margens.

Radioterapia pode ser o tratamento de escolha em pacientes não candidatos à cirurgia, desde que não apresentem as contraindicações discutidas anteriormente nos tumores de baixo risco. A radioterapia adjuvante sempre será discutida em tumores com margens comprometidas nos quais a reabordagem cirúrgica por algum motivo não é possível, bem como em tumores com invasão perineural de nervos ≥ 0,1 mm (nervos na derme profunda), e em de linfonodos positivos ou invasão muscular/óssea ou invasão parotídea.

Terapia sistêmica no CEC vem sendo recentemente cada vez mais discutida pela incorporação da imunoterapia ao arsenal terapêutico aprovado no Brasil. Essas drogas têm ação anti-PD-1 e representam o tratamento padrão para pacientes com CEC de pele avançado não passível de tratamento cirúrgico e/ou radioterápico. É sempre fundamental exame clínico dos linfonodos frente CEC, principalmente em se tratando de CEC de alto/muito alto risco.

Exames de imagem complementares, como ultrassom e/ou CT com contraste, podem ser necessários em alguns casos para avalição linfonodal. Não há um critério certo para a pesquisa de linfonodo sentinela no CEC, sendo assim costuma não ser indicado rotineiramente.18 Pacientes com linfonodo suspeito pela clínica ou pela imagem devem ser biopsiados por agulha (PAAF), “core biópsia” ou até mesmo excisão do linfonodo. No caso de comprovação do comprometimento linfonodal, será necessário estadiamento completo.

Se não houver doença sistêmica, o paciente será submetido à exérese da doença primária e à linfadenectomia regional que será específica a cada caso, seguidas de radioterapia adjuvante com ou sem terapia sistêmica associada.

Em casos não cirúrgicos, serão avaliados radioterapia e/ ou tratamento sistêmico.18,30  Tumores de alto/muito alto risco podem necessitar de exames de imagem para melhor avaliação do tumor.31 CT é o exame de escolha para avaliação de osso e cadeia linfonodal, enquanto RNM é o exame mais indicado para avaliação de tecidos moles e nervo.32 O ultrassom pode ser um exame alternativo ao CT com contraste para avaliar linfonodos.

O tratamento dos CEC de alto/muito alto risco muitas vezes é complexo e exige o envolvimento de uma equipe multidisciplinar (tumor board), em que a participação do dermatologista é fundamental. Todos os casos devem ser cautelosamente analisados, levando em conta as características do tumor e do paciente para que as melhores decisões terapêuticas sejam tomadas em prol dele.

Os principais objetivos do tratamento do CEC são a completa remoção do tumor e a máxima preservação da função e da cosmética.

“NUNCA PODEMOS NOS ESQUECER DE QUE A PRIMEIRA CHANCE DE CURAR O PACIENTE É A MELHOR CHANCE.”

Figura 8 - Área de alto risco: nessa nova versão da NCCN 2021, a área M (em verde) fronte, bochechas, couro cabeludo, pescoço e pré-tbial se fundiu com a área H (em azul) mãos e pés, genitália e a área de máscara da face, que inclui face central, pálpebras, periocular, sobrancelhas, nariz, lábios e perilabial, mento, pré e pós-auricular, orelhas, têmpora) e se tornaram uma unidade única de alto risco.

7 | Acompanhamento

O seguimento dos pacientes que tiveram CEC é mandatório, visto que 30% a 50% deles desenvolverão outro CEC nos próximos 5 anos,33 além do risco de desenvolver melanoma e CBC. Esse risco é maior ainda em pacientes que apresentam múltiplos CECs. É importante termos em mente que 70% a 80% das recidivas costumam acontecer nos primeiros 2 anos após o diagnóstico, por isso, nessa fase, visitas ao dermatologista devem ser mais frequentes.7,11

A consulta dermatológica deve abordar o exame físico de toda a pele do paciente, bem como o exame clínico de linfonodos. A frequência exata desse acompanhamento pós-tratamento vai ser baseada em vários fatores relativos ao paciente e ao tumor e deve ser individualizada. Alguns guidelines recomendam protocolos que podem auxiliar:18,30

1. Os tumores que NÃO tiveram comprometimento linfonodal podem ser acompanhados a cada 3 a 6 meses nos primeiros 2 anos. Se não surgir nenhum novo tumor nesse período, o acompanhamento poderá espaçar a cada 6 a 12 meses nos próximos 3 anos e, depois de 5 anos, devemos seguir anualmente, durante a vida toda. Nos tumores considerados de alto ou muito alto risco, exames de imagem complementares, como ultrassom, RNM e CT, podem ser indicados, dependendo de cada caso, com o objetivo de avaliar recidivas locais, comprometimento linfonodal e metástases a distância. Seguimento com equipe multidisciplinar é muitas vezes necessário.

2. Os tumores que tiveram acometimento linfonodal devem ser acompanhados a cada 1 a 3 meses no primeiro ano e, depois, de 2 a 4 meses por mais um ano. Nos próximos 3 anos, esse acompanhamento espaça para 4 a 6 meses. Após os 5 anos, é importante acompanhar de 6 a 12 meses pela vida toda.

Nesses pacientes, o seguimento com CT contrastada pode ser necessário como screening para avaliação de recidiva na cadeia linfonodal ou metástase a distância. Nessa categoria de pacientes, é indispensável abordagem multidisciplinar.

Após o diagnóstico do CEC, é importante que o dermatologista oriente o paciente sobre a doença e o ensine a reconhecer precocemente lesões novas na pele, bem como a fazer o autoexame de palpação de linfonodos nos pacientes de alto risco.

Isso possibilita que o paciente acesse o serviço de saúde mais precocemente, em caso de recidivas ou progressão da doença. Quanto mais precoce for esse reconhecimento do avanço da doença, mais rápida será a intervenção, melhorando o prognóstico do paciente.34

8 | Prevenção

De modo geral, a prevenção do CEC pode ser contemplada em dois pilares: o tratamento das queratoses actínicas e a fotoproteção. Sabemos que as queratoses actínicas são pré-neoplasias que, se não tratadas, podem evoluir para o CEC. Esse tratamento deve ser o mais precoce possível, principalmente em pacientes com queratoses actínicas difusas e/ou campo de cancerização, já que são os pacientes com mais risco de desenvolver múltiplos CECs.

Os tratamentos das queratoses actínicas podem ser feitos com crioterapia, curetagem e eletrocoagulação, 5-FU tópico, imiquimode a 5% tópico, ingenol mebutato tópico e PDT. Esses tratamentos foram abordados na separata anterior.35 As queratoses actínicas com clínica atípica ou que não respondem aos tratamentos mencionados devem ser biopsiadas para avaliação histológica.

A incidência de novos cânceres de pele em pacientes transplantados está relacionada com a dose e o tempo de uso dos imunossupressores. Em pacientes que apresentam lesões de alto risco que possam ameaçar a sobrevida ou aqueles que desenvolvem múltiplos tumores muito rapidamente, a diminuição na dose dos imunossupressores ou a troca deles pelos inibidores de m-TOR deve ser discutida pela equipe de transplante.

A quimioprofilaxia pode ser introduzida nos pacientes com risco aumentado de desenvolver novas lesões de câncer de pele. Entre as drogas, estão os retinoides orais que apresentam benefícios nos pacientes de muito alto risco, mas não são isentas de efeitos colaterais e, pelo risco de teratogenicidade, devem ser avaliadas com muita cautela em mulheres em idade fértil.

Vale frisar que o uso tópico de tretinoína não trouxe benefícios na prevenção de novas lesões nem deve ser usada como profilático.36

A nicotinamida é a forma amida da vitamina B3 e estudos mostram que auxilia no reparo ao DNA causado pela radiação UV. Os efeitos colaterais na dose preconizada, 500 mg, 2x ao dia, são mínimos. Um estudo australiano37 mostrou redução de 30% no surgimento de novos CECs, 20% no surgimento de novos CBCs e 13% na redução de novas queratoses actínicas em 12 meses.

É importante que não se confunda a nicotinamida com a niacina, visto que essa última pode causar efeitos colaterais, como flushing. Ainda faltam estudos prospectivos de longo prazo da nicotinamida, mas parece ser uma droga promissora e pode ser prescrita a pacientes que tiveram mais que um CEC ou com campo cancerizável.18,30

Quando falamos em prevenção do câncer de pele, é imperativo que reforcemos a fotoproteção no conceito amplo do termo, que é adotar um conjunto de medidas que minimizem os danos solares, como uso de filtro solares tópicos, evitar horários de exposição solar no pico da radiação UVB, usar roupas de proteção solar, procurar sombras, usar chapéu e óculos e, por fim, avaliar o uso de fotoprotetor oral que, por sua ação antioxidante e de reparação de DNA, pode contribuir na proteção solar.38,39

Estudos prospectivos randomizados mostraram que o uso regular de protetores solares reduz significativamente as taxas de aparecimento de novas queratoses actínicas e novos CECs e aumenta as taxas de remissão das queratoses actínicas já existentes.40-42 É importante que isso seja reforçado em todas as consultas dos pacientes com risco de desenvolver novos tumores cutâneos. O fato de ter tido um tumor cutâneo não é motivação suficiente para aderir ao filtro solar, como mostrou um estudo realizado nos EUA.43 Por fim, cabe a nós, dermatologistas, à execução de campanhas regulares que ensinem a população hábitos de fotoproteção, bem como reconhecimento precoce dos tumores cutâneos.


Dra. Mariana Nadalin Meireles | CRM-SP: 119.997/RQE: 38.986

Médica dermatologista graduada pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)

Especialista em Dermatologia pela Associação Médica Brasileira e Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD)

Cirurgiã dermatológica e de Cirurgia Micrográfica de Mohs pelo Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo Fellowship em Dermatopatologia e Mohs na Clínica Compass, em San Diego (EUA)

Certificada pela SBD como cirurgiã de Mohs

Preceptora de Cirurgia Micrográfica de Mohs pela Universidade Federal de São Paulo

Coordenadora científica do Curso de Cirurgia Micrográfica da SBD/SBCD

Chefe do Departamento de Cirurgia Micrográfica da SBD (2021/2022)