Diagnóstico e tratamento

Vertigem posicional paroxística benigna

É a causa mais comum de sintomas breves de vertigem secundárias a movimentos da cabeça e do corpo.

Autor/a: Shayna R. Cole, AuD, CCC-A and Julie A. Honaker, PhD, CCC-A

Fuente: Benign paroxysmal positional vertigo: Effective diagnosis and treatment

Resumo

A vertigem posicional paroxística benigna (VPPB), causada quando as partículas de cálcio (otoconia), que são normalmente inscrustadas em uma parte do ouvido interno, são deslocadas e se movem para os canais semicirculares do ouvido interno. É a causa mais comum de sintomas breves de vertigem secundária a movimentos da cabeça e do corpo.

Como a condição é de difícil manejo, , Cole e Honaker (2022) revisaram o diagnóstico diferencial para pacientes que apresentam tontura e vertigem, a fisiopatologia da VPPB, como diagnosticá-la usando manobras desencadeadoras de sintomas e nistagmo, como interpretar o padrão do nistagmo para determinar onde estão os cálculos e como tratá-la usando diferentes manobras de reposicionamento.

Introdução

A vertigem é um sintoma frequente que pode impactar indivíduos de todas as faixas etárias; cerca de 15% dos adultos nos Estados Unidos relataram questões relacionadas ao equilíbrio ou à sensação de tontura. É uma das principais razões de atendimentos de emergência, secundários a condições benignas (por exemplo, condições vestibulares, enxaqueca, condições psicogênicas) e condições graves (por exemplo, acidente vascular cerebral, doença inflamatória do sistema nervoso central, tumor intracraniano ou hemorragia).

Infelizmente, os distúrbios do equilíbrio costumam ser difíceis de diagnosticar e controlar, em parte devido aos sintomas subjetivos e à complexidade das condições neurológicas, cardiovasculares, metabólicas, tóxicas, vestibulares e psiquiátricas que podem causar. Além disso, podem se assemelhar aos das condições com risco de vida, dificultando o diagnóstico.

Tontura vs Vertigem

A tontura é qualquer distorção da sensação de onde alguém está dentro de um espaço, enquanto a vertigem é uma falsa sensação de movimento, especificamente rotação ou giro.

Um histórico clínico completo pode diferenciar entre as sensações e selar uma causa. As perguntas devem centrar-se no seguinte:

  • Qualidade dos sintomas, como vertigem, oscilopsia (a ilusão de que os objetos estão se movendo de um lado para o outro), desequilíbrio geral ou tontura.
  • Curso temporal dos sintomas, incluindo velocidade de início, duração, circunstâncias de início, tempo desde o episódio inicial e frequência dos episódios.
  • Fatores associados, como enxaqueca ou alterações na visão, audição ou respiração.
  • Fatores de exacerbação e alívio, como movimentos da cabeça ou do corpo, fechar ou abrir os olhos, olhar em uma direção ou outra, entrar ou sair de um campo visual ocupado, tossir, espirrar ou sons altos.
  • Outros antecedentes médicos relevantes, como problemas de visão, deficiências nas extremidades inferiores, medicamentos que podem causar tontura, diabetes, neuropatia, doença cerebrovascular, acidente vascular cerebral, dor no pescoço, convulsões, hipertensão, problemas cardíacos ou ototoxicidade.

Distúrbios vestibulares comuns têm características típicas que são a chave para restringir rapidamente a causa dos sintomas e fazer os encaminhamentos apropriados.

Uma causa comum de tontura e vertigem

A vertigem posicional paroxística benigna (VPPB) é uma das causas vestibulares mais comuns de tontura. Sua prevalência aumenta com a idade e afeta mais frequentemente pessoas com mais de 40 anos. É mais comum em mulheres do que em homens.

Ainda que a VPPB seja comum, muitas vezes passa despercebida, levando a procedimentos diagnósticos, encaminhamentos e tratamentos dispendiosos e desnecessários. Se não for detectada e tratada, a condição pode levar à má qualidade de vida e quedas.

Episódios breves de vertigem associadas com o movimento

A VPPB se apresenta como breve episódios de vertigem, que podem durar de segundos a minutos e se associam com o movimento da cabeça, do pescoço ou mudanças gerais de posição. Gatilhos comuns incluem:

  • Rolar na cama.
  • Olhar para cima ou para baixo.
  • Levantar-se de uma posição supina.
  • Deitar-se.
  • Inclinar-se para a frente.

Pode haver uma curta latência de segundos entre a mudança de posição inicial e os sintomas correspondentes. Os pacientes também podem sentir náuseas ou vômitos durante um episódio e relatar uma sensação geral de flutuação ou desequilíbrio.

Causas da vertigem posicional paroxística benigna (VPPB)

Profundamente dentro da parte petrosa do osso temporal está o labirinto membranoso, alojado dentro do labirinto ósseo (Figura 1). O labirinto membranoso é preenchido por líquido (endolinfa) e abriga a cóclea e as estruturas vestibulares: os 3 canais semicirculares -anterior, posterior e horizontal (também chamado de lateral) e os 2 órgãos otolíticos (sáculo e utrículo). Os canais semicirculares detectam a aceleração angular e os órgãos otolíticos a aceleração linear, fornecendo pistas internas para orientação de posição no espaço, movimento, estabilização do olhar e controle postural.

Os movimentos do corpo fazem com que o fluido nos canais semicirculares se mova e estimule os cílios das células ciliadas sensoriais. Isso desencadeia a transmissão de sinais neurais ao cérebro para iniciar respostas reflexas apropriadas aos ajustes dos olhos, da cabeça e da postura. Esses movimentos reflexos nos permitem ver as coisas com clareza quando nossa cabeça e corpo estão se movendo e nos impedem de cair.

Os 3 canais semicirculares são posicionados em ângulos de 90 graus entre si e podem, portanto, detectar a rotação em todas as direções. Assim, por exemplo, ao virar a cabeça para olhar por cima do ombro direito, o canal semicircular horizontal direito é excitado e o horizontal esquerdo é inibido.

O utrículo e o sáculo são sensíveis à gravidade e contêm cristais densos chamados otocônios que repousam sobre os órgãos dos sentidos. Com movimentos lineares (por exemplo, inclinando-se para um lado), essesse movem e sinalizam respostas reflexas semelhantes às dos canais semicirculares para manter o equilíbrio dos olhos, da cabeça e do corpo.

A VPPB é causada por otocônios flutuantes que se desprenderam dos órgãos otolíticos como resultado de lesão, infecção, diabetes, enxaqueca, osteoporose, repouso prolongado no leito ou envelhecimento. Como cada canal semicircular está orientado em um plano diferente no espaço, quando os otocônios se acumulam em um ou mais deles, podem ser estimulados pela mudança de posição, causando vertigem e nistagmo.

A maioria dos casos de VPPB é idiopática ou causada por traumatismo craniano, mas pode resultar de outros distúrbios vestibulares (por exemplo, doença de Ménière, labirintite) ou distúrbios do sistema nervoso central (por exemplo, enxaqueca, esclerose múltipla).

Evidências recentes sugeriram que a VPPB tem um aspecto sazonal, talvez relacionado a níveis variáveis ​​de vitamina D ao longo do ano. As otocônias são compostas de carbonato de cálcio e, portanto, podem ter fatores de risco para desmineralização, semelhantes aos ossos.

Manobras de diagnóstico

A vertigem posicional paroxística benigna é relativamente simples de diagnosticar e tratar. Movendo o paciente em diferentes posições, observando os movimentos dos olhos e perguntando se a cabeça está girando, os médicos podem determinar qual canal semicircular está sendo estimulado. A otocônia no canal semicircular posterior é responsável por até 90% dos casos, com a do canal horizontal responsável pela maior parte do restante, enquanto o envolvimento do canal semicircular anterior é relativamente raro. .

O nistagmo é a oscilação ocular e pode ser horizontal (para o lado e para trás), torcional (de natureza rotativa) ou vertical (para cima ou para baixo e para trás) ou uma combinação de alguns ou todos os três. A direção e as características dos movimentos oculares correspondem ao canal semicircular estimulado durante o posicionamento. Os sintomas são breves, geralmente durando menos de 60 segundos.

> Manobra de Dix-Hallpike

Variantes de VPPB envolvendo os canais semicirculares verticais (ou seja, anterior e posterior) são diagnosticadas usando a manobra de Dix-Hallpike. Consiste em 2 mudanças de posição (sentado para supino e supino para sentado) com a cabeça do paciente virada a 45° (Figura 2). Quando esse é movido da posição sentada para a supina, o clínico pode observar o padrão de movimento ocular excitatório do canal com otocônio, com nistagmo horizontal em direção à orelha afetada e qualquer um dos seguintes:

  • Acima (se os otocônios estiverem no canal posterior).
  • Abaixo (se estiverem no canal anterior).

Quando o paciente faz a transição da posição supina para sentada, um padrão de nistagmo reverso deve ser observado, indicando inibição do canal com otocônia, com nistagmo torcional para o lado saudável e qualquer um dos seguintes:

  • Acima (para o canal posterior)
  • Abaixo (para o canal anterior)

> Teste de rotação supino

O teste de rotação supino é recomendado como segunda manobra de detecção. Um sinal positivo de VPPB durante esse exame é o nistagmo horizontal nas posições esquerda e direita da cabeça. Se o nistagmo estiver na mesma direção em que a cabeça está girando, o padrão é chamado de geotrópico. Se for na direção oposta, é chamado apogeotrópico.

Figura 1. Teste de rotação supina para detecção de otocônios em canais semicirculares horizontais. (A) Com o paciente em decúbito dorsal, o clínico vira rapidamente a cabeça do paciente para a direita e avalia o paciente quanto a nistagmo horizontal e sintomas. (B) Após 30 a 60 segundos, o clínico rapidamente vira a cabeça do paciente para a esquerda e novamente observa nistagmo horizontal e sintomas. A direção do nistagmo (ou seja, geotrópico vs. apogeotrópico) com mudanças no movimento da cabeça indica o canal horizontal afetado.

O teste de rotação supino é recomendado como segunda manobra de detecção. Um sinal positivo de VPPB durante esse exame é o nistagmo horizontal nas posições esquerda e direita da cabeça. Se o nistagmo estiver na mesma direção em que a cabeça está girando, o padrão é chamado de geotrópico. Se for na direção oposta, é chamado apogeotrópico.

Manobras de tratamento

Uma vez diagnosticada a VPPB, o tratamento se baseia no canal semicircular afetado. Isso implica em uma série de movimentos da cabeça e do corpo guiados pelo médico para puxar os otocônios para fora do canal semicircular e de volta para o utrículo, com a ajuda da gravidade. O processo é simples e pode ser realizado em uma cadeira de exame padrão que pode ser totalmente reclinada ou em uma mesa. Essas manobras geralmente podem fornecer alívio imediato e duradouro. Em vários estudos, sua eficácia variou de aproximadamente 76% a 93%.

> Manobra de Epley para VPPB do canal posterior ou anterior

Em 1992, Epley descreveu uma série de movimentos da cabeça e do corpo para puxar os otocônios dos canais semicirculares verticais. O procedimento é fácil de ser realizado porém requer atenção para manter a cabeça e o corpo do paciente na posição adequada durante toda a manobra (Figura 4). Além disso, os olhos dos pacientes devem ser monitorados ao decorrer de cada etapa  para observar o padrão de nistagmo, o qual deve permanecer consistente como constatado durante a manobra de Dix-Hallpike. Os padrões de nistagmo consistentes asseguram que o médico moveu a otocônia para um canal semicircular diferentes.

A manobra de Epley para eliminar a otocônia dos canais semicirculares posterior ou anterior:

  1. Colocar o paciente sentado na cama e virar a cabeça 45° em direção à orelha com suspeita de otocônio. As inserções coloridas mostram o movimento da otocônia.
  2. Mova rapidamente o paciente para uma posição supina com a cabeça virada e estendida para baixo.
  3. Mova a cabeça do paciente para o outro lado, tendo o cuidado de mantê-la no plano correto. A posição final após a torção deve ser de 45° em relação à orelha não afetada, estendida para baixo.
  4. Ajude o paciente a ficar no lado não afetado com o queixo do paciente a 45° da orelha não afetada (o paciente ficará de frente para o chão nesta posição).
  5. Finalmente, ajude o paciente a sentar-se, mantendo a cabeça virada sobre o ombro.

> Manobra de Semont

A manobra de Semont é uma alternativa adequada para a de Epley para tratar VPPB do canal vertical. Esta requer mover rapidamente o paciente através de uma série de posições da cabeça e do corpo. 

  1. Colocar o paciente sentado na cama e virar a cabeça 45° para longe da orelha com a otocônia suspeita no canal semicircular vertical.
  2. Mova rapidamente o paciente para o lado com o nariz voltado para o teto.
  3. Mova rapidamente o paciente para cima e para o outro lado com a cabeça no mesmo ângulo de 45° com o nariz voltado para o chão. O examinador então ajuda o paciente a sentar-se, segurando a cabeça a 45° da orelha com suspeita de vertigem posicional paroxística vertical benigna do canal semicircular (VPPB).

Assim como na manobra de Epley, o clínico deve se concentrar nos padrões de nistagmo ao longo da manobra, que devem ser consistentes com aqueles observados durante o exame diagnóstico (por exemplo, a manobra de Dix-Hallpike).

> A manobra de giro para o tratamento da VPPB do canal horizontal

Conforme observado acima, o diagnóstico adequado de VPPB do canal semicircular horizontal no lado afetado requer uma revisão cuidadosa do padrão do nistagmo (geotrópico vs. apogeotrópico) durante o teste de rotação supina.

O canal horizontal geotrópico VPPB é mais comum que o apogeotrópico. Muitas vezes, ouvir o paciente descrever seus sintomas e observar os padrões do nistagmo ajuda a determinar qual lado é afetado e deve ser tratado. Além disso, muitos outros distúrbios podem apresentar nistagmo horizontal de redirecionamento e, nesses casos, uma avaliação completa deve ser realizada para confirmar ou descartar a VPPB.

Como a VPPB de canal semicircular horizontal geotrópica é mais comum do que a variante apogeotrópica, os médicos podem realizar a manobra de rotação de 360°. Se a variante estiver presente, a manobra de Gufoni pode ser realizada. Seguir as etapas mostradas na Figura 6 garante o posicionamento adequado da cabeça e do corpo para remover detritos do canal horizontal afetado. É imperativo apoiar a cabeça do paciente durante todos os movimentos. O paciente deve permanecer em cada posição até que os sintomas e o nistagmo desapareçam.

  • Manobra de rotação (360°) para limpar otocônios do canal semicircular horizontal:
  • Colocar o paciente em decúbito dorsal e girar a cabeça 90° em direção à orelha com otocônio suspeito no canal semicircular horizontal.
  • Em seguida, gire a cabeça do paciente para o centro, com a cabeça elevada 30°.
  • Manobre o paciente lateralmente (90°) em direção à orelha não afetada.
  • Mova o paciente para a posição prona com os cotovelos flexionados. Observação: às vezes, o tratamento pode terminar nesta posição (chamada de manobra de 270°).
  • Por fim, ajude o paciente a virar o rosto para longe da orelha afetada, completando uma rotação completa de 360°.